O esporte brasileiro viveu seu auge durante os governos populares do período de 2003 a 2016 com destacada participação dos comunistas. O período que vai de 2007 a 2016 é por muitos considerado “a década de ouro” do esporte no Brasil.
Por Ricardo Leyser Gonçalves* e Vicente José de Lima Neto**
Partindo de uma situação de abandono das políticas públicas de esporte, o PCdoB assumiu a direção do Ministério do Esporte logo na sua criação, em janeiro de 2003, fruto do desmembramento do antigo Ministério do Esporte e Turismo, respaldado pelo sucesso da condução dos comunistas da CPI CBF-Nike (2000-2001) e da gestão pioneira da Secretaria Municipal de Esporte e Lazer da Cidade de São Paulo (2001-2004). Logo o que era o menor Ministério da esplanada começou a se destacar com uma forte agenda social, apoio aos atletas e organização de grandes eventos esportivos.
Traduzindo suas concepções mais gerais para a atuação dentro do campo de políticas públicas de esporte, os comunistas marcaram sua presença pela postura democrática, dialogando com todos os segmentos esportivos e realizando três Conferências Nacionais do Esporte e Lazer. Sempre buscando o desenvolvimento nacional e local, levando infraestrutura inédita para as regiões norte e nordeste, e desenvolvendo tecnologia de ponta em programas de inclusão social através do esporte. Hoje, mesmo com o desmonte promovido pelos governos Temer e Bolsonaro, o Brasil conta com equipamentos esportivos capazes de realizar qualquer evento esportivo nacional ou internacional.
A partir da participação no governo central, o Partido ocupou várias posições de destaque na gestão pública em órgãos responsáveis pela política esportiva, ampliando a presença política do PCdoB e desenvolvendo a capacidade na área de gestão pública e esporte de dezenas de quadros partidários, que ocupam ou ocuparam importantes posições em prefeituras, estados e na União.
Se no Governo FHC os programas sociais atingiram um pico de atendimento de 90.000 jovens, nas gestões do PCdoB esse número superou a casa de 2 milhões de beneficiados/ano. À política de extermínio da juventude brasileira o partido ofereceu uma alternativa inteligente, prazerosa e de baixo custo. Programas como o Segundo Tempo, o Esporte e Lazer da Cidade, o Pintando a Cidadania e Pintando a Liberdade, o Bolsa Atleta, a Lei Federal de Incentivo ao Esporte, as Praças da Juventude, se desenvolveram e demonstraram o enorme potencial de políticas esportivo-sociais.
Após uma ausência de décadas, o Brasil voltou a sediar grandes eventos esportivos internacionais, ocupando um lugar de destaque nesse importante mercado internacional antes amplamente dominado por grandes potências do hemisfério norte. Para se entender a importância desse feito, que colocou o país como o mundialmente mais bem sucedido na década 2010/2019, basta lembrar que em 2009 a Cidade do Rio de Janeiro venceu as cidades de Chicago, Tóquio e Madrid, representadas respectivamente por Barack Obama, Presidente dos Estados Unidos da América e natural daquela cidade, o Primeiro Ministro do Japão Yukio Hatoyama, além do Rei da Espanha Juan Carlos e do Primeiro Ministro José Luis Zapatero.
Realizando importantes investimentos ao logo de uma grande série de eventos esportivos internacionais (Jogos Pan-americanos e Parapan-americanos Rio 2007, Jogos Mundiais Militares 2011, Copa das Confederações FIFA 2013, Copa do Mundo FIFA 2014 e Jogos Olímpicos e Paralímpicos Rio 2016), o Ministério do Esporte conseguiu estabelecer uma racionalidade econômica em um processo de longo prazo, permitindo que investimentos dos Jogos Rio 2007, por exemplo, fossem utilizados em megaeventos em 2011, 2014 e 2016, diminuindo o custo unitário de cada evento e maximizando os benefícios da realização de cada um deles.
O Diagnóstico do Esporte realizado pela Fundação Getúlio Vargas estimou que o multiplicador econômico desses investimentos foi de 3,84, o que significa que para cada um R$ 1,00 investido no esporte, a economia brasileira movimentos R$ 3,84. Para se ter uma ideia da efetividade econômica desse programa, o multiplicador médio da atividade econômica é de 2,74.
A infraestrutura esportiva brasileira foi amplamente modernizada e iniciou-se um processo de nacionalização dos equipamentos com vistas a dotar todos os estados brasileiros de condições mínimas básicas para a prática esportiva de qualidade. Para se entender a dimensão do que foi realizado em tão pouco tempo, basta lembrar que em 2002 o país contava com uma única pista de atletismo em condições de sediar uma competição oficial, localizada em Belém do Pará. Ao final de 2016 o Ministério do esporte tinha liberado recursos para a execução de mais de 30 pistas oficiais em todos os 26 estados e o distrito Federal, quase todas prontas e em funcionamento.
Com o mesmo intuito, mas sob a ótica da oferta da prática esportiva para parcelas mais amplas da população, o Programa Centro de Iniciação ao Esporte selecionou 250 cidades para a implantação de infraestrutura esportiva comunitária de alta qualidade. Foram selecionadas regiões, por todo o Brasil, com baixos indicadores sociais e priorizados locais próximos à implantação de moradias do Programa Minha Casa, Minha Vida, aproximando a oferta de oferta à população atendida por essa importante iniciativa. Contudo, a maior parte desses contratos não teve prosseguimento já no governo Temer, privando a população do acesso ao esporte.
Os comunistas também se esforçaram para modernizar a legislação esportiva e para garantir a ampliação do financiamento ao esporte, desempenhando papel fundamental para a aprovação das seguintes medidas:
- Lei 10.671/2003 – Estatuto de Defesa do Torcedor
- Lei 10.672/2003 – Lei da Moralização do Esporte
- Lei 11.438/2006 – Lei de Incentivo ao Esporte
- Criação da TIMEMANIA em 2008
- Lei 12.299/2010, aprimorando o Estatuto do Torcedor
- Lei 12.395/2011 – Nova Lei Pelé
É também de responsabilidade dos comunistas o apoio que permitiu que o paradesporto florescesse no Brasil a ponto de alcançar a condição de potência mundial. Financiando diretamente o Comitê Paralímpico Brasileiro através de inúmeros convênios, investindo na construção do moderníssimo Centro Paralímpico Brasileiro, um dos três principais complexos paradesportivos mundiais, e ampliando os valores de repasse das Loterias, o Ministério do Esporte foi o principal parceiro do desenvolvimento do esporte para pessoas com deficiência no país.
A principal derrota do esporte na história recente foi a extinção do Ministério do Esporte pelo Governo Bolsonaro. Apoiando-se em discurso liberal raso, o novo governo extinguiu o órgão gestor do esporte nacional com a justificativa de cortar gastos e diminuir o tamanho do governo, substituindo-o por uma Secretaria Especial subordinada ao Ministério da Cidadania. Após os aplausos iniciais de importantes ex-atletas a medida revelou-se em sua essência: a destruição completa da atuação estatal na promoção do esporte.
A extinção do Ministério do Esporte foi a primeira medida a escancarar o desprezo do Governo Bolsonaro pelo esporte como política pública. A perda de orçamento, a destruição da capacidade administrativa e a alta rotatividade dos Secretários Especiais, três em pouco mais de 1 ano, completam o quadro desolador.
A falta de protagonismo do governo federal, reforçada pela apatia da maioria dos dirigentes esportivos, muitos deles simpáticos ao bolsonarismo, levou a uma situação de abandono total das políticas esportivas, a ponto de não existirem propostas concretas de auxílio ao segmento esportivo para enfrentar os efeitos devastadores da pandemia de Covid-19. Inúmeros segmentos esportivos estão sendo beneficiados por medidas de enfrentamento aos efeitos econômicos da pandemia, mas o esporte é solenemente ignorado.
Não podemos esquecer que o investimento em esporte tem grande efeito sobre a saúde da população e uma população mais saudável é menos vulnerável em situações de pandemia como a atual. Esse impacto foi quantificado em diversos estudos e a Organização das Nações Unidas estima que para cada R$ 1,00 investido em esporte, se economizam R$ 3,20 em programas de saúde.
Nessa fase de profundas dificuldades, mais uma vez os comunistas são chamados para ajudar a construir saídas. A mobilização em torno da aprovação do Projeto de Lei 2824/20 (ações emergenciais para o segmento) também tem as digitais vermelhas. Também os comunistas estão chamados para a elaboração de uma plataforma de reconstrução do esporte nacional, com vários segmentos já envolvidos, o que deve resultar em grande mobilização em torno do tema. Ao imobilismo do governo central devemos responder com a mobilização democrática das cidades em apoio ao esporte.
Ao autoritarismo do governo federal devemos responder com propostas que permitam a apropriação democrática dos espaços urbanos através da prática de atividades esportivas como a caminhada, as corridas de rua, os passeios ciclísticos e a ruas de lazer. Ao aumento da exclusão social responderemos com a retomada dos investimentos em programas sociais esportivos, articulados com atividades culturais e educacionais, priorizando as áreas mais carentes.
Em meio à pandemia que já ceifou a vida de dezenas de milhares de brasileiros é preciso que os comunistas levantem a bandeira do esporte como meio para construir uma população mais forte, mais saudável e com melhores condições de enfrentar as diversas doenças que assolam a humanidade.
Em função das eleições municipais vindouras, urge a apresentação de propostas concretas para o esporte local. Assim, sugerimos:
Construção de sistemas municipais de esporte e lazer;
Destinação de 1% do orçamento municipal para o setor;
Criação do Fundo Municipal de Esporte e Lazer;
Criação de Lei Municipal para o Incentivo ao Esporte;
Criação da Bolsa Atleta municipal;
Implantação de programas que promovam o fortalecimento do futebol nas comunidades e que promovam a prática do futebol feminino;
Realização do censo municipal do esporte;
Realização da Conferência Municipal do Esporte e Lazer;
Capacitação de dirigentes esportivos (ligas, clubes, associações);
Realização de cursos para elaboração de projetos esportivos;
Retomada de programas sociais com base no esporte, articulados com a cultura e educação, principalmente nas regiões vulneráveis;
Ampliação das iniciativas para o estímulo à prática de atividades físicas nas ruas, parques, equipamentos – ciclismo, corridas, caminhadas, entre outros.
*Ricardo Leyser Gonçalves é consultor. Formação: Administrador Público (EAESP/FGV), Cientista Social (FFLCH/USP) e Mestrando em Gestão e Políticas Públicas (EAESP/FGV). Participou das experiências dos comunistas na Secretaria Municipal de Esportes e Lazer da Prefeitura de São Paulo e no Ministério do Esporte. Secretário nacional de Esporte Educacional e de Alto Rendimento, secretário executivo e Ministro Interino.
**Vicente José de Lima Neto, graduado em Turismo (Faculdade de Turismo da Bahia – Factur); pós-graduação em Administração (UFBA), bacharel de Direito (Faculdade 2 de Julho). Secretário de Cultura, Esporte e Lazer (Lauro de Freitas). No Ministério do Esporte foi Chefe de Gabinete, secretário Nacional de Educação, Esporte, Lazer e Inclusão Social, e secretário Executivo substituto, chegando a assumir, as funções de Ministro. Foi presidente da Embratur e atualmente é Diretor-Geral da Superintendência dos Desportos da Bahia (SUDESB).